Dispõe sobre a proibição de descarte de pintinhos machos recém eclodidos no Estado de São Paulo por meio da adoção de tecnologias de sexagem in ovo.
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO DECRETA:
Artigo 1º – Fica proibido no âmbito do Estado de São Paulo o descarte de pintinhos machos recém eclodidos por meio de trituração, eletrocussão, sufocamento ou outros métodos similares.
Artigo 2º – Os incubatórios e as empresas de genética que comercializam aves recém eclodidas terão o prazo de 1 ano para se adequarem assim que houver uma tecnologia de sexagem in ovo comercialmente disponível no mercado, e assim realizarem o descarte dos ovos até o 6º (sexto) dia após a incubação.
Artigo 3º – O descarte de aves em qualquer etapa do seu desenvolvimento somente será permitido por motivo de risco à saúde pública, justificada por meio de laudo técnico, assinado pelo médico veterinário responsável, aprovado pela autoridade sanitária estadual.
Parágrafo único – Na hipótese prevista no “caput” deste artigo, o descarte deverá ser realizado mediante insensibilização prévia dos animais, preservando ao máximo as aves do sofrimento.
Artigo 4º – Em caso de descumprimento desta lei, a autoridade sanitária estadual aplicará multa no valor de 100 (cem) UFESP por animal descartado e, havendo reincidência, a multa será aplicada em dobro.
Parágrafo único – Havendo mais de uma reincidência, a empresa poderá ter o alvará de funcionamento suspenso por prazo indeterminado, até a regularização de sua operação, sem prejuízo das multas aplicáveis.
Artigo 5º – As receitas oriundas do valor das multas serão aplicadas em pesquisas e programas de bem-estar animal de animais criados para consumo de universidades públicas do Estado de São Paulo ou a um fundo de bem-estar animal destinado ao fomento de programas e projetos de cuidados dos animais.
Artigo 6º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICATIVA
Este Projeto de Lei parte de uma solicitação feita pela Animal Equality Brasil em parceria com a Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, a Sinergia Animal, a Mercy For Animals, que compõem a Coalizão de Proteção Animal para combater a crueldade contra animais de fazenda em todas as etapas da cadeia de produção de alimentos. Unidas, estas organizações pedem aos Deputados da Alesp que se pronunciem contra uma das piores atrocidades da indústria de ovos: o descarte de pintinhos machos.
O Estado de São Paulo é o maior produtor de ovos do Brasil. Todos os anos, 25 milhões de pintinhos machos são triturados vivos ou descartados por outros métodos cruéis, como asfixia, após a eclosão dos ovos pela indústria do Estado.
Isto ocorre porque a indústria utiliza aves com diferentes linhagens genéticas para a produção de carne e de ovos. As linhagens de frangos têm sido modificadas geneticamente para que os animais cresçam mais rápido e produzam mais carne, enquanto as linhagens das aves poedeiras têm sido modificadas para produção intensiva de ovos. Neste segundo tipo, os pintinhos machos não possuem valor econômico para a indústria, pois além de não produzirem ovos, não alcançam o mesmo padrão de crescimento e de qualidade desejável pela indústria de carne de frango. Por esse motivo, esses animais são descartados após a eclosão dos ovos. Os métodos mais comuns de descarte praticados pela indústria de ovos são a trituração dos animais ainda vivos e o sufocamento.
Estas práticas ferem a vedação da crueldade animal prevista no art. 225, §1º, inciso VII, da Constituição Federal e o disposto no Artigo 32, da Lei nº 9.605/98, que podem ser evitadas por meio de leis e políticas públicas que protejam os animais. Cabe lembrar que é dever do Estado desenvolver políticas públicas para preservar o bem-estar de animais criados para consumo, atuando na mediação entre os interesses da indústria e os da sociedade para garantir o bem-estar dos animais e a prática de meios humanitários de criação, descarte e abate.
Em termos semelhantes, a Lei Estadual nº 11140/2018, que Institui o Código de Direito e Bem-estar animal do Estado da Paraíba, consiste em um marco legislativo na matéria do Direito dos Animais no país, ao estabelecer em seu art. 2º que animais são seres sencientes e nascem iguais perante a vida, devendo ser alvos de políticas públicas governamentais garantidoras de suas existências dignas.
De acordo com a Declaração de Cambridge sobre Consciência em Animais Não Humanos2 e vários estudos científicos3 sobre cognição, emoção e comportamento de galinhas, é possível afirmar que esses animais desde muito jovens também possuem capacidade de sentir emoções.
No caso dos pintinhos, os primeiros nervos aferentes sensoriais do embrião se desenvolvem no quarto dia de incubação, mas uma conexão sináptica com a medula espinhal não está presente antes do sétimo dia de incubação, o que torna a capacidade de sentir dor (nocicepção) impossível no primeiro terço da incubação1. Já um pintinho de um dia de vida tem o sistema nervoso formado e plena capacidade de sentir dor.
Sabendo da capacidade do pintinho de um dia de sentir dor, ter consciência, sentir emoções e ser provido de capacidades cognitivas, devemos usar essas informações para nortear leis que protejam esses animais. Isso é o que outros países, como França, Alemanha e Suíça tem feito ao propor a proibição legal da trituração de pintinhos.
Atualmente existem meios menos cruéis de realizar o descarte de animais considerados não produtivos para a indústria. As técnicas de sexagem in ovo permitem a identificação do sexo do embrião poucos dias após a incubação, preconizando que essa identificação seja feita antes do sétimo dia de incubação, pois assim tem-se a garantia que o processo de descarte do ovo não provocará dor no embrião, pois como mencionado acima, estudos científicos mostram que até o sétimo dia de incubação os embriões ainda não estão plenamente formados e, portanto, ainda não são capazes de sentir dor.
Alguns países europeus já anunciaram publicamente a intenção de banir esta prática, sendo que na Alemanha e na Itália estão sendo realizados pilotos para lançamento em escala industrial. O Federal Ministry of Food and Agriculture declarou que possivelmente até o final de 2021 a tecnologia permitirá o banimento da prática de trituração em pintinhos machos 4. Na Itália, a Assoavi – associação comercial que representa os maiores produtores de ovos no país – declarou seu compromisso com a introdução da sexagem in ovo no país, evitando assim completamente o nascimento de milhões de pintinhos machos e o seu descarte. A maior cadeia de supermercados italiana, Coop, também manifestou-se declarando publicamente que está empenhada em introduzir tecnologias de sexagem in ovo. Faz-se necessário, portanto, que as empresas brasileiras também invistam nessa tecnologia para acabar de uma vez por todas com a prática do descarte cruel.
Por todo o exposto, contamos com o apoio dos Nobres Pares para a aprovação do Projeto de Lei em tela.